Eu, mulher negra, RESISTO!
domingo, 15 de junho de 2014
O machismo é livre, o racismo se mascara pra andar solto por aí
O domingo estava chatinho, queria ficar na cama mas resolvi ser paulista e fui dar uma volta na avenida paulista, gosto do clima da R. Augusta e paulista no domingo. Me troquei, coloquei calça jeans, tênis e camiseta, arrumei o black e saí de casa. Fone de ouvido, ouvindo racionais e estava caminhando um pouco apressada. Subindo a frei caneca, tinha um casal na minha frente, não sei se eles saíram de algum lugar ou se andando rápido eu os alcancei, só percebi eles quando eu estava bem perto, uns 10 passos eu acho. Olhei pra frente, vi o casal, nesse momento o rapaz olhou pra mim, colocou a mão nas costas da namorada, tipo meio empurrando ela. Ela reclamou, não ouvi o que disse, quando ela reclamou ele olhou pra mim de novo e ela acompanhou o olhar. Depois disso os dois começaram a andar mais rápido, eu saquei o que estava acontecendo e apertei o passo também. Eles começaram a andar bem mais rápido, a moça até tropeçou no próprio salto.
Aí eu desencanei, passei por eles, olhei pra trás com uma cara de (?????) e segui em direção a Rua augusta. Racismo minha gente, só isso. Eu sinto cheiro de racismo de longe, em pequenos gestos. Não é porque sou ninja, é porque sou negra e além disso, não sou uma pessoa que acompanha a moda, do tipo arrumadinha. Qualquer pessoa branca que tivesse ali comigo, namorada, amiga, conhecida, não teria percebido nada, nem teria entendido nada e se pá teriam me tirado de louca ainda.Mas esses racismos não declarados em voz alta, só as pessoas negras percebem mesmo e é importante não ignorar saca? é bom deixar claro pro racista que você percebeu o crime, mesmo que ele não tenha dito em voz alta. É importante saber também preta, que você quando passa por situações assim, que ninguém percebe, você não esta louca, não é coisa da sua cabeça e nem exagero. Qualquer branco diria pra mim: ah, mas uma mulher de quase 1,90 assusta mesmo! Claro, se fosse uma moça loira do olho azul com quase 1,90 as pessoas sairiam quase correndo num domingo as 4 da tarde? Tá, conta outra. Eu tô ligada como me olham, e porque olham. O racismo não é um caso isolado, é só prestar atenção que ele esta ali escondido em algum lugar e se depender de mim não passará sem ser percebido e de algum modo combatido nem que seja informando o racista de que sei que ele é racista.Ninguém me convence que me olham torto porque uso alargadores ou porque sou alta. Me olham torto porque não sou branca e não tenho cabelo alisado no padrão aceitável para uma pessoa não marginal. Na cabeça das pessoas brancas tem algo errado comigo e essa noção de errado parte do principio que não sou branca e tenho cabelo crespo, os outros acessórios só ajudam a completam o quadro preconceituoso onde o stopim é o racismo.
Pois bem, como estou acostumada esse lance não ficou na minha cama por mais de 60 segundos. Continuei caminhando pela augusta, dei minha volta pela avenida paulista e quando estava descendo tinha um grupo de homens na minha frente e como eu estava comendo estava descendo devagar. Eles falavam alto e fui prestar atenção na conversa. Pelo que entendi eles estavam reclamando que a namorada de um deles estava se tornando feminista.Um dos homens disse " Ela vem com essas ideias aí, quando ficar sozinha vai se ferrar porque as mulheres vem com feminismo pra roubar o homem da outra", todos os rapazes riram e a conversa seguiu e o moço completou " e ainda vem falar pra eu ler sobre feminismo pra entender ela? e mulher lê alguma coisa util?", outro coleguinha dele completou: " elas leem capricho e o blog da lola", e o moço que aparentemente é o namorado terminou dizendo: " no caso dela nem isso, ela deve ler rótulo de produto de limpeza e manual de chapinha, neguinha do carai". Depois disso eles continuaram rindo e começaram a falar de outras coisas. Um dia comum, num passeio comum e rápido, fiquei menos de 2h na rua. A diferença é que eu estava atenta como eu estou quase sempre. Por mais que o discurso da modernidade seja atraente, pareça bom e parece que inclui todo mundo, na pratica as mesmas pessoas de sempre continuam fora da lista.
Escrevi esse texto pra tentar causar uma reflexão sobre as ações educativas mesmo. Não vale desqualificar o casal branco como ignorante e os rapazes de 'moleques" para tentar dizer que são exceções, não são. Racismo e machismo são regra.
O discurso mulherista Afreekano e o silenciamento das mulheres Pretas
"
Uma negra
E uma criança nos braços
Solitária na floresta
De concreto e aço
Veja
Olha outra vez
O rosto na multidão
A multidão é um monstro
Sem rosto e coração"
Antes que qualquer coisa, o feminismo não é branco, o feminismo não é das mulheres brancas, quem te contou isso não é seu amigo. Sim, amigO porque eu tenho certeza que foi um homem. Frequentemente acompanho o discurso masculino enganando mulheres, afastando-as de qualquer ajuntamento que possa trazer qualquer força e possibilidade de aprendizado contra as mazelas masculinas. Esse discurso já vestiu várias roupas. Os homens inventaram que feminismo era coisa de quem não tinha o que fazer, coisa de mulheres
fáceis
, lésbicas e que não querem namorar/casar mulheres que frequentam esses meios. Num mundo onde as mulheres são educadas para respeitar os homens, a mulherada acaba ficando desconfiada e se afastando desse tal feminismo, afinal a pressão social faz com que a gente arrisque menos, porque qualquer coisa que uma mulher negra faça, ela terá no mínimo duas flechas apontadas pra ela de volta. O discurso masculino atual para afastar mulheres do feminismo é a desculpa "africanidade". “Somos afreekanos e como afreekanos precisamos lutar primeiro pela raça, depois pelo
gênero
e sempre junto com os homens que são nossos companheiros”. Esse discurso tem milhões de problemas, mas vou falar só de um. Esse discursinho masculino é bem mentiroso porque abarca um monte de mentiras, mas é atrativo para as mulheres negras porque nós estamos afastadas e somos enganadas em vários meios, é claro que um discurso de apoio, carinho e união será atraente. Seria um sonho ser valorizada, cuidada, amada e respeitada né?
Pois é, os mesmos homens que produzem textos ilusórios e lindíssimos sobre irmandade afreekana são acusados de agredirem fisicamente suas esposas, coagir mulheres na hora do sexo, serem favoráveis a poligamia masculina e muitos deles são contra o uso da camisinha, contaminando suas “irmãs” negras com várias DSTs. Pois é, o mundo afreekano importado por homens machistas brasileiros esta destruindo a vida de muitas pretas que foram atraídas pra mais uma mentira masculina. E o pior é que as mulheres envolvidas nisso tudo ficam tão fragilizadas que não conversam com ninguém, essa ideologia de amor afrocentrado ensina que não se deve fazer “ pecuinha” e que mulheres são competidoras, então além de estarem fragilizadas pelos abusos masculinos, estas mulheres não tem pra onde correr.
Essa situação lembra alguma coisa da vida “real” pra vocês? Sim, é machismo! Machismo branco ou machismo afreekano exclui, mata e silencia mulheres. Qualquer um que tentar te silenciar não é seu amigo, não é seu irmão. E ficar longe do feminismo só prejudica você mesma mulher. Os homens que te maltrataram, não o fizeram por motivos pessoais, não foi nada que você fez, a culpa não é sua. Todos os homens que te maltrataram fizeram isso porque a estrutura da sociedade permite isso, assim como brancos são racistas, homens são machistas. E por mais que existam exceções, é preciso se juntar com seus pares para se defender e mulher preta, seu par para lutar contra o machismo sempre será com outras mulheres, sempre. Fugir disso é se colocar dentro da cova dos leões. Não duvido da força de nenhuma mulher preta, mas não fiquem sozinhas e nem caiam na
lábia
dos agressores.
A situação é tão grave que esse assunto não é enfrentado, as pessoas que defendem essa corrente são muito convincentes e agressivas, até ameaça de estupro por parte delas sofri por imbox e a justificativa do estupro é porque "você esta destruindo a irmandade afreekana". O Brasil é machista, os homens foram todos criados assim, e a culpa NÃO é da mãe deles, eles querem continuar machistas porque eles tem VANTAGEM com o machismo e pra eles interessa o fim do racismo, porque os afeta.
O homem negro não consegue exercer completamente seu poder masculino aqui no Brasil porque o racismo os impede, dentro da lógica racista eles são menores que os homens brancos e por isso ALGUNS {em numero crescente} estão descarregando toda a frustração em cima das mulheres pretas com a desculpa: Primeiro lutaremos contra o racismo, depois veremos isso de " machismo". Não se enganem preta, o opressor nunca dará o poder ao oprimido, precisamos conquista-lo. Não se enganem, não somos princesas e nem rainhas, somos mulheres, somos seres políticos existentes e estamos sendo deixadas sozinhas. Eu não estou dizendo que os homens negros são machistas, não estou dizendo que os homens afreekanos são machistas, eu estou dizendo que os homens são machistas e precisamos tomar cuidado com os discursos que mudam de nome mas a ação é a mesma: escravizar mulheres e no caso do amor afrocentrado e o discurso de "mulherismo afreekano": escravizar mulheres negras. Eu não estou dizendo para que vocês não formem pares negros, não estou defendendo nenhum homem e não estou dizendo para que as mulheres pretas se tornem lésbicas. Eu estou dizendo para desconfiar dos homens e de suas boas intenções ao afasta-la do feminismo, estou dizendo para você se fortalecer entre mulheres porque temos muito em comum para nos apoiar. Nossa luta é no mínimo dupla, precisamos estar entre mulheres e entre negros para nos fortalecer, precisamos entender que somos mulheres e negras e lutar só por um lado não nos fortalece completamente. Entendendo-se africanas ou não, nós precisamos agir com os problemas que temos no lugar onde vivemos. Transportar-se para outra era é fugir dos assuntos que nos ferem hoje, e por mais que fugir pareça uma boa saída, no final pretas, somos nós que ficamos sozinhas com uma criança nos braços, abandonadas. Nós precisamos nos juntar pra entender como o mundo que nós vivemos funciona e lutar contra aquilo que nos fere, não individualmente, mas juntas. O machismo fere á todas porque lutar só quando atinge a mim? Não existe igualdade sem libertação feminina, e a libertação feminina virá através da nossa união, por isso eles tentam nos impedir a todo custo.
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