quinta-feira, 25 de agosto de 2011

O humor que maltrata, é pra rir?

- Não acho graça,não vou rir.




O humor é uma linguagem e como toda linguagem deve ser: livre. O humor também possui um discurso ideológico e é destinado a um público específico. Portanto, deve ser passível de crítica. Há uma categoria no humor que podemos chamar de chavão ou clichê. São aquelas piadas do tempo de nossos avós. São as piadas sobre mulheres feias ou burras, "bichinhas", pretos pobres e qualquer outra minoria que possa ser estereotipada. 

Você já ouviu piadas do tipo: "O que são 4 homens brancos heterossexuais num fusca verde?" Pois é. Piadas estão aí desde que o mundo é mundo, mas o humor funciona mesmo quando subverte nossa lógica e nos tira do senso-comum. Fazer piada com quem está por baixo socialmente é moleza. Reproduzir preconceitos que são passados há gerações na famílias é fácil. Mulheres estão  aí,  sendo chamada de canhão na rua todo dia.

 Quero ver é fazer rir sem apelar para ofensa. Num país onde somos ensinadas a não deixarmos ser estupradas, ao invés de ensinar que estupro é crime, esse tipo de humor tem um valor simbólico imensurável para identificarmos que o machismo está aí, em homens e é tão naturalizado que pode vir em forma de risos.

“Todo dia 8 de março, volto para casa e vejo um monte de mulheres com rosas vermelhas na mão, no metrô. É um sinal de cavalheirismo, dizem. Mas, no mesmo metrô, muitas mulheres são encoxadas todos os dias. Tanto que o Rio criou um vagão exclusivo para as mulheres, para que elas fujam de quem as assedia. Pois é, eles não punem os responsáveis. Acham difícil. Preferem isolar as vítimas.” Trecho de “Dispenso essa rosa”, de Marjorie Rodrigues.

Muitas pessoas não entendem porque os humoristas da vez estão sendo boicotados, muitos dizem: Hora, é só humor! Mas quem acha graça? Todas nós precisamos parar de agir no automático, e levar as situações mais a sério. Quando uma piada pode e causa mal estar em alguém, não é engraçado.
Quando uma piada é usada como forma de manter exclusões, também não. Relaxar, rir e brincar não quer dizer humilhar o outro. Estão querendo fazer com que seja, mas não é porque "sempre" foi assim que deve continuar a ser.  




Em resposta aos que acham que humor sem humilhar, excluir e maltratar é "politicamente correto e sem graça",apresento a humorista norte- americana: 


Wanda Sykes. 

Onde estão as humoristas mulheres do Brasil? 

sábado, 20 de agosto de 2011

Ame-se Preta, Ame-se Negra, Ame-se Afro!

Ame-se gorda, Ame-se Alta, Ame-se baixa, Ame-se hoje, Ame-se diferente!


Cabelo de preta pode nascer liso, enrolado crespo, carapinha ou tudo isso junto! Cabelo de preta não é tudo igual!

Mas a gente sabe que o cabelos de preta que mais são agredidos são os crespo e carapinha né?
Sempre tem alguém pra dizer: Seu cabelo é ruim!, Seu cabelo é feio!, seu cabelo é Duro!

Essa é a hora que a gente diz: Meu cabelo é lindo! e não é duro não, ele nasce na minha cabeça e é muito bom, macio e cheiroso. duro,ruim é o racismo que faz você pensar assim  do meu cabelo.


Cabelo Afro dá muito trabalho!
Quem já ouviu isso levanta a mão o/

Olha, cabelo afro normalmente é só lavar e secar. Tem quem use um  leave-inHidratação uma vez por semana ( alguns nem isso) e deixar ele brilhar! Livre pra pegar sol, chuva, praia. 

Agora o alisado precisa de: Lavar, secar, hidratar mais de 2 vezes na semana, escovar, alisar,esticar, cortar as partes danificadas e gastar rios de dinheiro com cremes que concertam problemas que você não tinha antes de alisar. rs E a chuva? Garoa? aiaiaiai.... Iso é se cuidar? xii....

E as dicas da internet?
-Seu Afro tem jeito!
-Seu cabelo Precisa de relaxamento!

Ô dona internet, meu cabelo não esta estressado não, não precisa relaxar!

E as justificativas?

- Não dá pra fazer nada com cabelo Afro/crespo/Carapinha, só dá pra usar solto ou Amarrado!

Não é verdade. você pode: Usar solto, amarrado, trançado, blackpower, moicano, Bote prender só de um lado, usar torço, turbante, faixa,tererê, olha.... milhões de coisas que demoram menos do que aquela escovinha básica. 

Bom, não tem desculpa né?  Ame-se!
Não sabe como? Ali na barra de video tem um monte de mulheres que irão te ajudar a cuidar do seu afro natural. Qualquer dúvida me deixem um recado.

Agora vamos cantar?


Hoje eu acordei com vontade de cantar, cantar bem alto: Eu Amo Meu Cabelo!





-Oi, eu sou seu cabelo natural, prazer em conhece-la! Aliás, você é linda!

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Afro-feminismo, porque?

   
    



Quando eu comecei a ouvir barulhinhos sobre feminismo sempre eram sobre mulheres brancas, mulheres europeias e estadunidenses. O máximo que  chegava perto de uma negra era para falar de Xica da Silva, e  ainda como uma lenda surreal, nunca como representação positiva, resistência. Quando os barulhinhos se tornaram ruídos mais frequentes, ouvi falar de uma tal de Angela Davis e uma negrinha ousada que atendia por Rosa Parks, só ouvia falar mesmo. Sem internet eram só ruídos pois estas mulheres não estavam na biblioteca, menos ainda na videoteca da escola ou do bairro onde eu morava. Eu gostava da ideia do feminismo, sou mulher e sentia que aquilo tinha tudo a ver comigo, mas faltava alguma coisa, minha representação ali ia somente até a página 2. Fui construída socialmente como mulher, e o feminismo me representa, me ajuda. Assim segui até a chegada da internet, aí então os tambores transformaram os ruídos em música! Música africana, latino-americana e caribenha.

     Descobri que o feminismo apesar de se apresentar branco, ele não é só isso.  Descobri que além de mulher sou negra e Lésbica, e estas informações fazem  toda a diferença! Para as mulheres negras fica muito difícil entender o feminismo e suas demandas   porque não há representação negra. Os livros indicados pelos sites feministas por  exemplo, são 99,99% de escritoras brancas que tem uma história completamente diferente, estes livros servem como conhecimento mas não servem para a prática feminista. As mulheres negras precisam olhar para o feminismo e ver mulheres negras, precisamos de espelhos, representação. Precisamos aprender quem somos pela perspectiva preta, negra da diáspora africana. 

    As pretas das favelas que sofrem sendo as maiores vitimas de violência doméstica, sofrem com os piores salários, piores empregos , maior Índice de mortalidade, racismo, lesbofobia, machismo e outras violências históricas normatizadas pelo espelho branco. Nesse sentido o feminismo tem muito a nos ensinar. Nós somos estas pretas que citei acima, temos a mesma face delas, somos suas irmãs, filhas, mães, vizinhas. Se colocarmos um espelho agora em nossa frente, quem ele refletirá, as brancas dos livros empolados ou as negras da diáspora? Faça o teste e diz aí então quem deve nos representar. Criei o blog para falar sobre mulheres negras e Lésbicas sob uma perspectiva Afro- Feminista.


Eu: Negra Mulher e Feminista, resisto!
continua....

Um dos primeiros tambores que ouvi....



ENEGRECER O FEMINISMO

"Quando falamos do mito da fragilidade feminina, que justificou historicamente a proteção paternalista dos homens sobre as mulheres, de que mulheres estamos falando? Nós, mulheres negras, fazemos parte de um  contingente de mulheres, provavelmente majoritário, que nunca reconheceram em si mesmas esse mito, porque nunca fomos tratadas como frágeis. Fazemos parte de um contingente de mulheres que trabalharam durante séculos como escravas nas lavouras ou nas ruas, como vendedoras, quituteiras, prostitutas… 
Mulheres que não entenderam nada quando as feministas disseram que as mulheres deveriam ganhar as ruas e trabalhar! Fazemos parte de um contingente de mulheres com identidade de objeto. Ontem, a serviço de frágeis sinhazinhas e de senhores de engenho tarados. Hoje, empregadas domésticas de mulheres liberadas e dondocas, ou de mulatas tipo exportação.

Em geral, a unidade na luta das mulheres em nossas  sociedades não depende apenas da nossa capacidade de superar as desigualdades geradas pela histórica hegemonia masculina, mas exige, também, a superação de ideologias complementares desse sistema de opressão, como é o caso do racismo. O racismo estabelece a inferioridade social dos segmentos negros da população em geral e das mulheres negras em particular, operando ademais como fator de divisão na luta das mulheres pelos privilégios que se instituem para as mulheres brancas. Nessa perspectiva, a luta das mulheres negras contra a opressão de gênero e de raça vem desenhando novos contornos para a ação política feminista e anti-racista, enriquecendo tanto a discussão da questão racial, como a questão de gênero na sociedade brasileira.Enegrecer o movimento feminista brasileiro tem significado, concretamente, demarcar e instituir na agenda do movimento de mulheres o peso que a questão racial tem na configuração, por exemplo, das políticas demográficas, na caracterização da questão da violência contra a mulher pela introdução do conceito de violência racial como aspecto determinante das formas de violência sofridas por metade da população feminina do país que não é branca; introduzir a discussão sobre as doenças étnicas/raciais ou as doenças com  maior incidência sobre a população negra como questões fundamentais na formulação de políticas públicas na área de saúde; instituir a crítica aos mecanismos de seleção no mercado de trabalho como a “boa aparência”, que mantém as desigualdades e os privilégios entre as mulheres brancas e negras.

CARNEIRO, Suely. Enegrecer o Feminismo: A Situação da Mulher Negra na América Latina a partir de uma perspectiva de gênero.In: Ashoka Empreendimentos Sociais; Takano Cidadania (Orgs.). Racismos Contemporâneos. Rio de Janeiro: Takano Editora, 2003. p. 49-58.

Carta às Mulheres do 9° Encontro Nacional Feminista-1987

Às Mulheres do 9° Encontro
Nacional Feminista
Guaranhuns / Pernambuco
Setembro de 1987



A postura do algumas feministas de ignorar a especificidade da mulher negra baseia-se no desconhecimento da grave questão racial que diariamente agride a mulher negra, embora a sociedade e o próprio movimento de mulheres se recusem assumir o racismo vigente.E não podemos nos considerar um sub-tema menor. Somos uma grande porcentagem nessa população feminina que se organiza contra a discriminação à mulher. Somos, entretanto, sozinhas quando se trata da discussão mais aguda que é a absurda marginalização social e econômica que nos confina aos espaços mais estreitos em razão da nossa cor.
Se a mulher branca repudia os limites sociais que a destinam às funções ditas femininas, a mulher negra sequer tem a permissão social para essas mesmas funções. Ou seja, ela não pode ser professora, secretária executiva, recepcionista ou rainha do lar. Ela ocupa o quarto dos fundos, junto com todas as inutilidades da casa. No mercado de trabalho é a que limpa a mesa das decisões.


Cabe a nós, mulheres negras, cobrar do movimento de mulheres uma seriedade maior em relação à nossa luta, conscientes do racismo que ainda permeia as nossas relações e que retarda o avanço do próprio movimento feminista.
Sabemos que começamos um trabalho cujos resultados não florescerão numa só primavera. Muitas estações, muitas mulheres negras e brancas se somarão nessa luta de seres, antes de tudo, humanos.O que vamos fazer, o quanto vamos colher, dependerá da participação da mulher negra, convocada em regime de urgência para avançar rumo a posições de decisões que até agora lhe foram negadas. Hoje queremos falar, porque temos do que falar. A mulher negra tem tradição de luta e tem história, não é uma alegoria carnavalesca.


A tradição dos orixás mulheres legou-nos outra dimensão maior de mulheres:

a liberdade que não reconhece no homem o seu senhor, a ousadia que não se acomoda na fragilidade dita feminina e a sensualidade sem culpa, tão natural como a dança e o ritmo que a mulher negra leva à perfeição. Essa liberdade é a nossa herança de mulheres guerreiras, superando séculos de opressão, retribuindo em brilho o axé da raça. Nossa força para Benê, Benedita da Silva, símbolo da resistência da mulher negra favelada, que desceu o morro para mudar esse cenário desigual. Nosso axé para Winnie Mandela, símbolo-mulher de uma raça que na África do Sul e no Brasil luta pelos seus direitos mais humanos.


AXÉ PARA TODAS VOCÊS !
COLETIVO DE MULHERES NEGRAS DA BAIXADA SANTISTA

*Documento/panfleto distribuído às participantes 1987